domingo, 1 de abril de 2012

PEQUENA REFLEXÃO SOBRE A SEMANA SANTA E A PÁSCOA

Sejamos nós cristãos católicos,ortodoxos, evangélicos... judeus, islâmicos, budistas, hinduístas, agnósticos, ateus...curvemo-nos todos diante do Mistério, ou da possibilidade do Mistério: o Deus-homem vem ao Mundo e se dá ao Sacrifício, ao Sacro-Ofício, morre em seu corpo de carne como o nosso e ressuscita neste mesmo corpo, para nos dar o Testemunho da Imortalidade.
Lembremo-nos do verso imortal de Fernando Pessoa: "O Mito é o nada que é tudo" e, seja qual for a nossa crença ou o tamanho da nossa descrença, coloquemo-nos todos juntos, em comunhão neste momento de irrupção do Tempo Sagrado no interior do tempo profano. Deixemo-nos tocar, deixemo-nos impregnar. Se a nossa descrença já impregnou todas as coisas, se nos sentimos impermeáveis a toda e qualquer Revelação, a qualquer Utopia de cunho sagrado ou humano, ainda assim suspendamos nossos juízos por um instante,para comungarmos a Grandeza anunciada nestes dias, a da morte e a da ressurreição do homem-Deus.
Incontáveis de nós estamos morrendo nas guerras, nas guerrilhas, nas emboscadas urbanas, nas emboscadas dentro dos próprios lares; incontáveis de nós estamos morrendo em cidades e nos campos devastados pela fome e pelas doenças; incontáveis de nós estamos morrendo de inanição emocional, em castelos de demasiado precárias muralhas; incontáveis de nós estamos morrendo órfãos de nós mesmos, reféns da terrível solidão de não mais nos reconhecermos nos pensamentos e atos de cada dia.Há infinitos modos de morrer, de se matar e de matar e a nossa morada, a Terra, está infestada deles.
Por um instante que seja, sintamo-nos Um Só, unidos através da miséria e da riqueza da nossa condição de seres humanos que seguem carregando a certeza ou a nostalgia do Deus dentro, ao redor e além de toda a nossa infinita pequenez. Sintamo-nos Um, com toda a nossa Esperança tornada ato, nossa Esperança impossível de ser extirpada, semente bendita para sempre, semente sempre-viva replantada, desde todo o Sempre, apesar da legião de mortos no mundo e das injustiças de toda espécie, que vêm se perpetuando ao longo dos milênios.

Zuleika dos Reis
Publicado no Recanto das Letras em 22/03/2008

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